sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

É fevereiro. O frio congelou tudo... quase tudo. A camada de gelo aumenta conforme o tempo passa. Tudo branco... quase tudo.

Shana acorda cedo, com seu pai tem uma viagem breve pra fazer. Sua avó precisa de cuidados e toda semana Izna, o pai, e um de seus quatro filhos se revezam para limpar a casa, catar galhos de árvores para aquecer a casa do frio do Norte. Prepraram pão e sopa. Organizam tudo... ou quase tudo.

É hora de partir... a neve se acumula, há barreiras geladas quase intransponíveis... as estradas são perigosas, estão perigosas. Mas é hora de voltar pra casa. A mãe de Shana e seus três irmãos a esperam. E com a guerra, atrasar significa um aumento em progressão geométrica do medo de quem espera.

Então, melhor partir... e pedir a Alá que proteja... o pai, a filha... o carro.

8 horas antes - Tudo se faz escuro, tudo se congela num frio paralisante. Na casa de Shana, a mãe e os irmãos dormem. O fogo do fogão já se apagara a tempo, uma corrente de ar gelado passa pelas frestas da janela, rachada. Lá fora tudo se verga ao peso da neve... dentro tudo se verga ao peso do medo.

A guerra e a sua inutilidade - só eu tenho trabalho mil e mil vezes multiplicado. Enfim, a guerra deve servir pra alguma coisa, acho... desde que me conheço por morte eu vejo homens em guerra.

Tropas russas invadem o vilarejo de Shana. Os humildes habitantes dormem o sono do descanso, um pouco de sono, um pouco de paz.

Os soldados embebam de gasolina algumas casas, ateiam fogo. Eu assisto com os olhos mortos. Nem toda a neve gelada foi capaz de atenuar o desastre. Tudo queimado... casas, móveis, corpos... passei por aí, mais uma vez.

10 horas da manhã - Shana e o pai chegaram ilesos, Alá os protegeu. Encontram crateras negras onde antes era sua casa... a casa de seus vizinhos. Crateras negras no branco imaculado da neve.

Não há mais casa, nem mãe, nem esposa, nem irmãos, nem filhos.